Ran (1985): Uma adaptação épica e visualmente deslumbrante de Akira Kurosawa do Rei Lear de Shakespeare

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Lançado em 1985, Ran (1985) é uma das obras mais importantes da carreira de Akira Kurosawa, que consagrou seu nome como um dos maiores cineastas da história do cinema.

Esta adaptação do clássico de William Shakespeare, Rei Lear, transposta para o Japão feudal, não apenas reinterpreta a tragédia shakespeariana, mas também mergulha em questões universais de poder, lealdade, traição e o impacto da guerra.

Com sua estética impecável, encenação magistral e uma profunda reflexão filosófica, o longa é uma verdadeira obra-prima do cinema mundial.

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O enredo de Ran (1985)

Imagem: The Movie Database

A História de Hidetora Ichimonji

A trama da adaptação Ran (1985) gira em torno de Hidetora Ichimonji (interpretado por Tatsuya Nakadai), um senhor feudal que decide dividir seu império entre seus três filhos.

Ele busca garantir sua aposentadoria pacífica e deixar um legado seguro, mas, como na história de Rei Lear, as escolhas feitas por Hidetora resultam em um trágico desmoronamento de sua família e do próprio império.

Hidetora confia sua herança ao filho mais velho, Taro, e aos outros dois filhos, Jiro e Saburo, mas sua decisão desencadeia uma série de traições, rivalidades e conflitos que devastam a todos.

O filme revela as consequências dessa divisão, à medida que os filhos traem o pai e a guerra se espalha, destruindo famílias e transformando uma terra de riqueza e poder em um campo de destruição.

A adaptação de Shakespeare no Japão feudal

A transposição do Rei Lear para o Japão

Akira Kurosawa, ao adaptar Rei Lear, fez uma escolha ousada ao transpor a tragédia shakespeariana para o contexto do Japão feudal, sem perder a essência do drama.

A moralidade, o amor e a lealdade que Shakespeare abordou em sua obra são tratados no filme de forma igualmente contundente. A questão da divisão do império e as consequências de uma liderança despótica ressoam com as dinâmicas de poder do Japão medieval.

A obra de Shakespeare, com sua ênfase na destruição de uma dinastia e a luta pela supremacia entre filhos e pais, encontra uma sintonia perfeita no cenário feudal japonês, onde as disputas de poder e a busca pela honra eram elementos centrais da sociedade.

Kurosawa, portanto, não apenas adaptação o enredo, mas também recriou a ambiência e a psique cultural do Japão, conectando a tragédia universal de Shakespeare à história do país.

As influências de Kurosawa no cinema mundial

A habilidade de Kurosawa em adaptar obras literárias ocidentais para o cinema japonês, mantendo a universalidade dos temas, já havia sido demonstrada em filmes como Os Sete Samurais (1954) e Trono Manchado de Sangue (1957).

Contudo, o longa se destaca por sua grandiosidade e profundidade filosófica. A adaptação de Kurosawa é mais do que uma simples transposição; é uma reflexão sobre o poder e o destino que transcende culturas.

A estética visual de Ran (1985)

Uma obra de arte visual

O aspecto visual de Ran (1985) é uma das características mais impressionantes do filme. Kurosawa, ao lado do diretor de fotografia, Asakazu Nakai, criou uma paleta de cores vibrantes e intensas, especialmente nas cenas de batalha, que se tornaram algumas das mais icônicas da história do cinema.

O uso do vermelho, azul e amarelo durante as cenas de guerra cria uma sensação de caos e destruição, ao mesmo tempo em que transmite a magnitude da tragédia.

As paisagens, muitas vezes mostradas em vastos campos abertos, contrastam com o drama emocional dos personagens, enfatizando a insignificância do ser humano diante do poder devastador da guerra e da ganância.

As sequências de batalha, particularmente a luta final entre os exércitos, são filmadas com uma coreografia de cenas impressionante, dando ao filme uma qualidade quase épica.

A atuação do elenco

Tatsuya Nakadai como Hidetora Ichimonji

Tatsuya Nakadai, um dos maiores atores do Japão, dá vida a Hidetora Ichimonji, o protagonista trágico do filme. Sua atuação é de uma profundidade emocional impressionante, transmitindo a loucura e o arrependimento de um homem que perde o controle sobre seu próprio destino.

Nakadai consegue capturar a transição de Hidetora de um líder arrogante e confiável para um homem quebrado, perdido e imerso na loucura.

O elenco de apoio

O restante do elenco de Ran (1985) também se destaca. Tatsuya Mihashi, Kenji Kawai e Akira Terao interpretam os filhos de Hidetora, cada um representando diferentes facetas da ambição humana e da traição.

Mieko Harada, como a esposa de Jiro, Lady Kaede, oferece uma performance memorável, trazendo uma intensidade visceral ao seu papel.

A construção dos personagens secundários é essencial para que a tragédia da família Ichimonji seja completamente sentida. A luta pelo poder entre os filhos de Hidetora é retratada com uma força emocional que ecoa o dilema central de Rei Lear.

A trilha sonora de Ran (1985)

A música de Toru Takemitsu

A trilha sonora de Ran (1985), composta por Toru Takemitsu, é uma das mais memoráveis do cinema. A música é minimalista e muitas vezes melancólica, acompanhando o clima de decadência e perda que permeia o filme.

Takemitsu utiliza a música não apenas como um complemento à narrativa, mas como uma extensão emocional do próprio filme, amplificando a tragédia e a sensação de desespero dos personagens.

A trilha sonora de Ran (1985) funciona de forma complementar ao visual deslumbrante do filme, intensificando as emoções de cada cena e contribuindo para a atmosfera única da obra.

O impacto de Ran (1985) no cinema

Uma obra-prima atemporal

Desde seu lançamento, Ran (1985) recebeu uma recepção crítica positiva e continua sendo considerado uma das maiores obras-primas do cinema mundial.

A maneira como Kurosawa equilibra a grandiosidade épica com a introspecção humana, tratando de questões de poder e loucura com uma sensibilidade única, fez de Ran um clássico.

O filme influenciou cineastas ao redor do mundo e continua a ser estudado em escolas de cinema, sendo uma referência essencial para quem deseja compreender a arte da adaptação e do storytelling visual. A estética, a direção de arte e a profundidade emocional continuam sendo temas de análise e admiração.

Conclusão

Ran (1985) é uma obra cinematográfica que transcende fronteiras culturais e temporais.

Com uma adaptação brilhante de Rei Lear, Akira Kurosawa criou um filme que é ao mesmo tempo uma meditação profunda sobre o poder, a tragédia e a condição humana, enquanto oferece uma experiência visual deslumbrante.

Se você ainda não viu este épico japonês, não perca a oportunidade de apreciar uma das maiores realizações da história do cinema.

Assista ao trailer de “Ran”

No Brasil, “Ran” está disponível na Amazon Prime Video.