Onde Fica a Casa do Meu Amigo? (Khane-ye doust kojast?, 1987): A Simplicidade e a Profundidade da Infância no Cinema Iraniano
Lançado em 1987, Onde Fica a Casa do Meu Amigo? (Khane-ye doust kojast?), dirigido por Abbas Kiarostami, é uma obra-prima do cinema iraniano que se distingue pela sua simplicidade e profundidade emocional.
O filme segue a história de Ahmad, um garoto de 10 anos, que embarca em uma jornada aparentemente simples: encontrar a casa de seu amigo Mohammad Reza e devolver-lhe um caderno antes que ele seja punido por sua professora.
Embora a trama seja simples, Kiarostami usa este enredo para explorar temas universais de amizade, moralidade e responsabilidade, com um olhar atento sobre as complexidades da infância.
A obra é uma das mais importantes do Novo Cinema Iraniano, que, a partir da década de 1980, começou a ganhar reconhecimento internacional.
Onde Fica a Casa do Meu Amigo? foi aclamado pela crítica por sua abordagem sensível e realista da vida cotidiana, usando uma narrativa quase minimalista para fazer profundas reflexões sobre a vida e a moral.
Neste artigo, vamos explorar as principais características do filme, suas mensagens subjacentes e o impacto que ele teve, tanto no cinema iraniano quanto na cena cinematográfica mundial.
Saiba mais:
A História de “Onde Fica a Casa do Meu Amigo?”

O Desafio de Ahmad: A Busca pela Casa de Mohammad Reza
A trama de Onde Fica a Casa do Meu Amigo? é construída de forma simples, mas com uma grande carga simbólica. Ahmad (interpretado por Babak Ahmadpoor) é um menino que vive em uma pequena vila no Irã.
Durante a escola, ele descobre que seu colega Mohammad Reza (interpretado por Farhad Yari) recebeu uma advertência de sua professora por não entregar seu caderno.
Ahmad se lembra que pegou o caderno de Mohammad Reza acidentalmente e, sentindo-se responsável, decide devolver o item antes que seu amigo seja punido.
A história começa com Ahmad tentando localizar a casa de Mohammad Reza, que mora em um bairro distante e desconhecido para ele.
A jornada de Ahmad pelas ruas de sua vila, onde ele encontra várias pessoas que, de alguma forma, tentam ajudá-lo ou redirecioná-lo, é o ponto central do filme. A busca, que parece simples, rapidamente se transforma em uma reflexão sobre a moralidade, a responsabilidade e a perda da inocência.
O Dilema Moral e a Simplicidade da Infância
A jornada de Ahmad não é apenas uma busca física para devolver um caderno perdido. Ao longo do caminho, ele enfrenta vários desafios e dilemas.
Primeiro, ele encontra várias figuras adultas, como professores e vizinhos, que lhe oferecem conselhos ou tentam ajudá-lo. Porém, nenhum deles tem uma solução fácil para o problema de Ahmad, o que faz com que ele se depare com a própria incerteza e limitação.
Ao longo dessa jornada, a simplicidade da busca de Ahmad reflete as complexidades morais da infância.
Ele não tem uma agenda própria, mas age de acordo com o que acredita ser a coisa certa. Sua determinação em corrigir seu erro, mesmo que isso o coloque em dificuldades, é um reflexo da pureza moral da infância.
A inocência de Ahmad é contrastada com as dificuldades do mundo adulto, que muitas vezes parece não se importar com questões simples de justiça.
Temas de “Onde Fica a Casa do Meu Amigo?”
A Amizade e a Responsabilidade
Onde Fica a Casa do Meu Amigo? é, antes de tudo, uma história sobre amizade e responsabilidade. Ahmad não apenas sente a necessidade de corrigir seu erro, mas também demonstra uma lealdade incrível ao seu amigo, apesar das dificuldades que ele enfrenta.
Essa amizade genuína é retratada sem exageros sentimentais, de maneira natural e verossímil, tornando a narrativa ainda mais comovente.
A responsabilidade de Ahmad, no entanto, vai além de devolver o caderno. A jornada física que ele empreende reflete uma responsabilidade moral que vai muito além da sua idade. Ele não questiona o que está fazendo; ele apenas faz o que acredita ser certo.
Isso coloca Onde Fica a Casa do Meu Amigo? como uma fábula sobre o caráter humano e a necessidade de agir de acordo com a ética, mesmo nas situações mais simples.
A Busca como Metáfora da Vida
A busca de Ahmad, por mais que pareça simples à primeira vista, carrega uma grande simbologia. Ele não está apenas indo atrás de uma casa ou tentando corrigir um pequeno erro. Sua jornada é, de fato, uma metáfora para a busca do ser humano por significado e justiça.
No caminho, ele encontra obstáculos e incertezas, mas também compaixão e ajuda de estranhos. A maneira como Ahmad lida com esses obstáculos é uma lição sobre perseverança e resiliência diante das dificuldades da vida.
Além disso, a jornada de Ahmad é marcada por sua falta de experiência e pela maneira como ele observa o mundo com uma visão pura, sem as complicações dos adultos.
Essa pureza de percepção é o que torna sua missão tão tocante, pois ele segue o caminho correto sem questionar ou ser influenciado pela complexidade que os adultos enxergam na vida.
O Mundo dos Adultos: Indiferença e Desconexão
Ao longo de sua jornada, Ahmad encontra várias figuras adultas que, de alguma forma, o ajudam ou lhe dão conselhos. No entanto, essas figuras não são ideais ou imunes a falhas. Elas representam um mundo de indiferença ou desconexão, uma característica comum na obra de Kiarostami.
Embora Onde Fica a Casa do Meu Amigo? seja em grande parte centrado na figura do menino, ele também faz um comentário sobre como os adultos muitas vezes se distanciam das preocupações genuínas da infância.
Ao contrário de Ahmad, que se vê imerso em uma missão que é pura e simples, os adultos ao seu redor estão preocupados com questões maiores, mais complexas e, muitas vezes, com problemas que não podem ser resolvidos facilmente.
Esta desconexão entre a infância e a vida adulta é um tema recorrente no cinema iraniano de Kiarostami, que sempre se dedica a mostrar as contradições entre as duas realidades.
A Estética e a Direção de Abbas Kiarostami
A Simplicidade Visual e a Profundidade Narrativa
Onde Fica a Casa do Meu Amigo? se destaca por sua estética simples, com longas tomadas e uma câmera que acompanha o personagem principal em sua jornada sem interrupções.
Kiarostami faz uso de planos longos e contemplativos, permitindo que a ação se desenrole de maneira gradual, sem pressa ou pressões externas.
Esta abordagem permite que o espectador se conecte com os sentimentos e as experiências de Ahmad de uma forma mais íntima e natural.
Onde Fica a Casa do Meu Amigo? não utiliza truques cinematográficos ou exageros para expressar emoções; em vez disso, ele constrói a narrativa de forma orgânica, permitindo que os detalhes mais sutis da vida cotidiana se tornem profundamente significativos.
A direção de Kiarostami, com sua paciência e precisão, coloca o espectador em um estado de reflexão sobre o que significa ser humano, o que significa viver em um mundo onde a inocência muitas vezes entra em conflito com a indiferença do mundo adulto.
O Uso da Paisagem e do Cenário
A paisagem de Onde Fica a Casa do Meu Amigo? também desempenha um papel importante na narrativa.
A vila, com suas ruas simples e habitantes desconectados, é quase como um personagem por si só. A paisagem e os ambientes despojados criam uma atmosfera de austeridade e solidão, complementando a jornada interna do protagonista.
Kiarostami faz uso da paisagem como uma metáfora para a busca de Ahmad – uma jornada não apenas física, mas também emocional. As ruas, os campos e as casas que Ahmad atravessa são espaços que representam os obstáculos da vida e as questões não resolvidas da infância.
O Legado de “Onde Fica a Casa do Meu Amigo?”
A Recepção Crítica e o Reconhecimento Internacional
Onde Fica a Casa do Meu Amigo? foi amplamente aclamado pela crítica internacional e é considerado um marco no cinema iraniano. O filme trouxe para o mundo a sensibilidade e a maestria de Abbas Kiarostami, que mais tarde se tornaria um dos maiores cineastas do século XX.
A obra é uma das primeiras do diretor a ser reconhecida fora do Irã, e sua abordagem realista e reflexiva sobre a vida e a moralidade lhe garantiu uma posição de destaque no cinema mundial.
O filme também abriu portas para outros cineastas iranianos, que seguiram o exemplo de Kiarostami ao criar obras que exploram temas universais através de uma perspectiva cultural iraniana.
Conclusão

Onde Fica a Casa do Meu Amigo? é um filme de uma simplicidade tocante e uma profundidade impressionante. A história de Ahmad e sua jornada para devolver o caderno de seu amigo é uma metáfora poderosa para a moralidade, a responsabilidade e a pureza da infância.
Abbas Kiarostami, com sua direção minimalista e sensível, cria uma obra que é, ao mesmo tempo, universal e profundamente iraniana. Um filme que continua a emocionar e a inspirar aqueles que se deparam com sua encantadora simplicidade.
Assista ao trailer de “Onde Fica a Casa do Meu Amigo?”
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