O filme “De Cabeça Erguida” (La Tête Haute, 2015), dirigido por Emmanuelle Bercot, é um dos dramas sociais mais sensíveis do cinema francês da última década.
Abrindo o Festival de Cannes de 2015 — feito raro para um drama social —, o longa acompanha a trajetória de Malony, um jovem em situação de risco, do abandono na infância à sua luta por reintegração, enfrentando um sistema judicial tão rígido quanto humano.
Mais do que uma crítica ao sistema, De Cabeça Erguida é uma ode à esperança, à perseverança e à importância do apoio emocional para jovens que cresceram à margem da sociedade.
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Sinopse de “De Cabeça Erguida”

Quem é Malony?
Desde pequeno, Malony (vivido intensamente por Rod Paradot, em seu primeiro papel no cinema) apresenta comportamentos agressivos e antissociais.
Aos seis anos, ele é praticamente abandonado por sua mãe, negligente e instável emocionalmente. A partir daí, sua vida passa a ser acompanhada pelo sistema judicial de menores.
Ao longo do filme, vemos Malony crescer sob a vigilância da juíza Florence Blaque (interpretada por Catherine Deneuve) e do educador Yann (interpretado por Benoît Magimel), que se esforçam para tirá-lo do ciclo de violência, negligência e autodestruição.
A jornada da redenção
Ao contrário de narrativas simplistas de reabilitação, De Cabeça Erguida mostra um processo lento, cheio de recaídas, conflitos e emoções à flor da pele.
Malony luta contra a raiva, o abandono e a sensação de inadequação — tudo enquanto o sistema tenta alcançá-lo não com punições, mas com escuta e presença.
O olhar de Emmanuelle Bercot: entre o social e o íntimo
Um drama com pé na realidade
A diretora Emmanuelle Bercot trabalhou em estreita colaboração com profissionais do sistema de justiça juvenil francês para construir um retrato fiel e realista dos desafios enfrentados por jovens infratores e pelas instituições que tentam resgatá-los.
O resultado é um filme que evita maniqueísmos e aposta na complexidade dos personagens.
Estilo visual sóbrio e imersivo
A direção aposta em uma câmera que acompanha de perto os personagens, especialmente Malony. Os enquadramentos muitas vezes claustrofóbicos refletem sua angústia, impulsividade e a constante vigilância a que está submetido. É um cinema direto, emocional, que busca o realismo acima de tudo.
Elenco e atuações
Rod Paradot: uma revelação
Rod Paradot, descoberto em escolas técnicas, oferece uma atuação crua e visceral. Seu desempenho lhe rendeu o prêmio César de Ator Revelação em 2016. A câmera confia nele, e sua entrega ao papel é tamanha que o espectador sente tanto sua fúria quanto sua fragilidade.
Catherine Deneuve: firmeza e compaixão
Como a juíza Blaque, Catherine Deneuve demonstra autoridade e humanidade em equilíbrio. Ela representa a esperança de que a justiça pode ser mais do que punição — pode também ser cuidado.
Benoît Magimel: o educador resiliente
Magimel vive o educador que tenta, com firmeza e empatia, conduzir Malony em direção a um futuro melhor. Sua atuação foi reconhecida com o César de Melhor Ator Coadjuvante, e sua presença é fundamental na construção de uma alternativa masculina saudável na vida do protagonista.
Justiça juvenil sob os holofotes
O que diferencia “De Cabeça Erguida”?
Ao contrário de filmes que exploram o crime juvenil de maneira sensacionalista, De Cabeça Erguida aposta na empatia. Ele apresenta as falhas do sistema, mas também mostra as tentativas reais de correção, mediação e escuta.
O título do filme — “De Cabeça Erguida” — é simbólico: trata-se de dar dignidade a quem muitas vezes foi privado até do direito de errar.
Uma mensagem para além da França
Mesmo sendo uma produção francesa, o filme ressoa internacionalmente ao levantar questões universais: como lidar com jovens infratores? Como romper o ciclo da exclusão social? Qual o papel da justiça na reabilitação?
Recepção e prêmios
Abertura em Cannes e impacto crítico
“De Cabeça Erguida” teve a honra de abrir o Festival de Cannes 2015, um gesto político e simbólico forte, dado seu tema e estilo. A crítica aclamou a coragem do longa de colocar a juventude marginalizada no centro da narrativa.
Principais prêmios
- César de Melhor Ator Revelação – Rod Paradot
- César de Melhor Ator Coadjuvante – Benoît Magimel
- Indicado a Melhor Filme no César
- Indicações a festivais internacionais de prestígio
Comparações e influências
Ecos de “Os Incompreendidos” e “Mommy”
“De Cabeça Erguida” tem semelhanças com o clássico “Os Incompreendidos” (1959), de Truffaut, ao abordar um jovem rebelde com sensibilidade e profundidade.
Também pode ser comparado ao canadense “Mommy” (2014), de Xavier Dolan, pela intensidade emocional e foco na relação entre adolescente e autoridade.
Conclusão: por que “De Cabeça Erguida” é essencial

“De Cabeça Erguida” é mais do que um filme sobre delinquência juvenil. É um olhar sincero sobre a infância ferida, a adolescência em crise e a difícil tarefa de manter a esperança em um mundo que frequentemente vira as costas para os mais vulneráveis.
Com atuações poderosas e uma direção firme, o longa nos convida a refletir sobre responsabilidade, justiça e, acima de tudo, empatia.
Em tempos em que a punição costuma falar mais alto que a compreensão, este drama francês oferece uma importante lição: ninguém está completamente perdido enquanto houver alguém disposto a escutar.
Assista ao trailer de “De Cabeça Erguida”
No Brasil, “De Cabeça Erguida” está disponível na Apple TV e YouTube Filmes.